quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

Desapega, filha, desapega!

Não há como evitar. Esses dias são de avaliação do que passou e esperança para o que inicia. Por isso são sempre meio piegas. Mesmo concordando com o poema do Drummond que nos fala da inutilidade das promessas de ano novo, não consigo deixar de fazer isso. Prometo e penso em coisas a partir da percepção do que não funcionou nesse ano que encerra. É fato que o que não funcionou geralmente é uma repetição de anos anteriores, o que por si só deveria ser um alerta. Mas sou temerária. Como disse, não consigo evitar. Então, lá vão minhas considerações sobre o ano novo. A começar pelo gasto, gastinho refrão: "Paz na terra aos homens de boa vontade". Choro todas as vezes que penso nessa frase. Só ponho um reparo no masculino e troco: "Paz na terra às pessoas de boa vontade". Que a paz delas se fortaleça e se espalhe, combatendo a violência dos sem boa vontade. De resto, sobra pouco para desejar. Até porque o que desejo é aprender a desapegar. Do excesso emocional. Do excesso em geral. Aprender a desapegar não é fácil não. Desapegar significa deixar de desejar. Só que é o desejo que nos impulsiona. Mas o excesso de desejo nos joga num ciclo vicioso de frustrações. Por isso, meu lema para o ano é "desapega, filha, desapega". Desapega dessa coisa neurótica de trabalhar tanto. Desapega do consumo excessivo (essa talvez não seja tão difícil dada minha natureza), desapega do "tem quê". Tem que acordar cedo (prá quê?) Tem que correr muito (pra quê?) tem que atender às expectativas internas e externas (prá quê?). Desapega, filha, desapega. Desacelera. Respira. Economiza energia vital para usar com o que interessa. Por que, como já disse o bardo "o que se leva dessa vida é o amor que a gente tem prá dar". Eu avisei: é uma época meio piegas...

quarta-feira, 9 de novembro de 2011

Hoje

Nem minha caixinha de verdades esquecidas está ajudando. Tirei várias fichas e nenhuma propriamente adequou-se. Opa! Dizem que a terceira tentativa nunca falha: "Ninguém pode inferiorizá-lo sem seu consentimento".

terça-feira, 8 de novembro de 2011

Porque eu amo esse homem

-Morzinho, cê gostou do meu jeito novo de pintar os olhos?
- Gostei.
- Você nem olhou.
- Seus óculos são pretos.
- Tirei os óculos, e agora?
- Gostei.
- Valoriza meu olhar?
- Valoriza.
...
- Agora acho que você custa 1,80 o quilo.

segunda-feira, 17 de outubro de 2011

Autoritarismo, Democracia: falar é fácil

Um dos problemas da democracia (só um dos milhões de) é o lugar da autoridade. O desconhecimento desse lugar legítimo, a transformação da autoridade em antônimo da democracia. Isso acontece muito quando tratamos com adolescentes ou adultos muito jovens. Por conta da insegurança natural do período e a falta de experiência, há uma tendência a perceber o exercício da autoridade como meramente autoritarismo (que pode ser) e nunca como forma de administrar o ambiente democrático. Às vezes isso pode acontecer em outras situações. Num congresso, por exemplo. Quando existem inúmeros trabalhos a serem apresentados e a autoridade omite-se de controlar o tempo pois esta geralmente é uma atitude antipática (e nem todos têm esse perfil). Acaba-se por colocar em risco o direito democrático de todos terem o mesmo tempo para falar e a mesma quantidade de atenção.

Escrevi o trecho acima há alguns meses, quando participava de um congresso. Pois bem, novamente em outro congresso. E, pela terceira vez, o problema se repete. Assisti a três mesas em que um dos apresentadores monopoliza a palavra e os outros ficam para apresentar, como dizem os amigos portugueses, "no vão da escada", na correria, com a platéia saindo para almoçar que ninguém é de ferro. Que a pessoa monopolize, tudo bem. Que alguns interessados em discutir o umbigo em detrimento do trabalho dos outros se interessem, tudo bem. Mas que a Mesa, a autoridade, se omita, haja paciência. Quando é que esse povo que coordena mesas em congressos vai entender que coordenar mesas em congressos implica em coordenar, inclusive cortando a palavra do sem noção que acha que todo mundo tem todo o tempo do mundo para escutá-lo(a)? Gente, não falo isso só por ser ranzinza (claro que sou!). Mas pq acho realmente que este tipo de situação demonstra como estamos no geral despreparados para o convívio democrático. E como, ao contrário, estamos propensos a aceitar gente que ganha no grito, não na discussão salutar dos conflitos possíveis. Só eu que acho isso perigoso? Pronto, falei.

sexta-feira, 9 de setembro de 2011

Fim de casamento

Não, não estou me divorciando. Continuo casada e muito feliz com meu casamento. Mas é que existem situações na vida que mesmo sem envolver o contrato matrimonial parecem ser fim de casamento. O processo é o mesmo. Primeiro aquele incômodo constante, aquela sensação de desamor. Depois a impaciência, a enorme dificuldade de relevar aquilo que sempre se relevou. A incapacidade de fazer vista grossa, a irritação inexoravelmente crescente, e a também ascendente capacidade de observar defeitos que não víamos antes. Mesmo com tudo isso, vamos protelando o inevitável. Tapando o sol com a peneira, achando escapes, fazendo coisas bem trabalhosas com a esperança de que,num passe de mágica, ou por conta do esforço, o cristal quebrado se recupere. No fundo, sabemos que é impossível, que não há salvação para essa vida compartilhada. Só que, como estamos presos na zona de conforto dos velhos hábitos, não nos damos ao luxo de aventar a possibilidade da separação, que é um processo bem doloroso. Mas final de casamento só conserta acabando e, com o tempo, a zona de conforto vai minguando, ficando irrisória. Aí, começamos a sentir raiva do outro. O começo da redenção é quando passamos a ter raiva de nós mesmos, por nos colocarmos numa situação tão ruim. Tá certo, o outro é um saco. Mas porque nos desvalorizamos? Porque nos sujeitamos a viver menos do que merecemos? Aí, começamos a sonhar acordados com outra vida. A olhar para os lados, a procurar novos afetos, a imaginar como seria bom se estivéssemos soltos no mundo. Quanto poderíamos fazer, para quantos lugares ir... Nem todos chegam nesse momento. Não é fácil e depende da força do auto-engano. Porém se somos minimamente operantes e com instinto de sobrevivência fora da zona de extinção, chega uma hora em que começamos a pensar em materializar o sonho. E daí para agir é um passo. Tá certo, nem sempre é um passo simples. Na maioria das vezes ficamos inseguros, somos dados a recaídas, as rupturas implicam em desordens de todo o tipo. Mas quase sempre sobrevivemos. E passamos a ter uma vida melhor, sem um fardo. Pois bem, voltando ao início destas linhas: se há vida inteligente depois de um casamento fracassado, quem dirá depois de uma relação menos complexa? Se é possível acabar com casamentos ruins, deve ser possível sair de empregos ruins, amizades ruins, tarefas incômodas, né não?

quinta-feira, 28 de julho de 2011

Preguiiiiiça

Minhas férias foram ótimas. Mas começaram com trabalho, um seminário em Istambul. Que eu financiei e depois fiquei pensando: fazer as férias ao redor do trabalho? Por que simplesmente não tirar férias? Mas, passada a primeira semana de trabalho, sobraram dez dias de férias reais, maravilhosas, com ocasionais idas ao email para trabalhar. Mas bem ocasionais, porque a conexão não era lá essas coisas, graças aos céus. E novamente estou por estas bandas de cá, tomando pé da situação. Da casa, organizando a vida, achando papéis, vendo contas, esquentando para o início do trabalho sem folga. Olhando para a quantidade de coisas que só empurrei para dentro do armário e que estão me esperando abrir a porta. Além de dar medo, faz-me refletir sobre a insensatez de viver neste ritmo alucinado e sem controle. Sem ócio, sem tempo para refletir. Por que a reflexão brota do embate do mundo vivido catalisada pelo ócio. Há anos penso assim, apesar de não conseguir sair deste ciclo vicioso (culpa, acredito, do excesso de energia que me indispõe ao ócio). Bem, hoje fiquei um pouco mais feliz. Lendo o Estadão, vi que Adauto Novaes fará outro de seus ciclos de debates Político Filosóficos. Desta feita exatamente sobre isso, a relação entre a preguiça, a reflexão e o domínio do tempo imposto pelo capitalismo. Viva! Será que terei tempo para participar?

terça-feira, 21 de junho de 2011

A raiz do problema

Não está em tudo o que não podemos fazer, mas sim no que desejamos fazer. Eu, por exemplo. Sou querelona. Quero tudo. Abraçar o mundo com as pernas, ficar nos oitenta e nunca nos oito. Trabalhar feito uma louca, em inúmeras frentes. Arrumar a casa compulsivamente (o que eu troco os móveis de lugar já virou piada no bairro). Cozinhar para multidões. Dar aulas, fazer trabalho administrativo, orientar alunos de Iniciação Científica e TCC, fazer pesquisa, publicar, organizar congressos e que tais, participar de eventos científicos, comissões e tudo o mais. E aprender a ser uma internauta mega blaster. Para piorar, quero ter tempo livre para ir ao sítio, ficar com o marido e os filhos, cuidar do cachorro, visitar os amigos, ir ao cinema, fazer ginástica, alimentar-me bem, viajar para Istambul. É óbvio que essa equação não pode fechar. Só de pensar nela começo a ficar com taquicardia e me dá vontade de ter um saco de papel para respirar dentro. Aí me lembro que também adoro assistir televisão (vem daí essas imagens americanas de como lidar com as crises). Eu devia era fazer terapia. Mas onde eu vou arranjar tempo para mais uma atividade?

segunda-feira, 13 de junho de 2011

Resoluções

Na segunda-feira, dia 13 de junho, adotei mais uma das minhas resoluções. Decidi não ser tão complacente com a humanidade. Perdoar menos, reclamar mais. Trabalhar proativamente para melhorar o mundo. Sei lá, resolvi. Às 11:15 comecei a por em prática minha resolução. Liguei para o taxista que devia me levar até o aeroporto e, pasmem! Ele tinha me esquecido. Pediu mil perdões, implorou e conseguiu outro taxista que viria em poucos minutos. Minha natureza afável já se contorcia de pena do sujeito quando lembrei: não, chega de complacência com os erros alheios. Então, coerente, simplesmente balbuciei um ahã e desliguei. Chegou o outro taxista, deixou-me no aeroporto. Tinha tempo de sobra, resolvi comer um sanduíche. Horas na fila. A atendente pegou o pedido e eu falei: quero nota paulista (a gente informa o CPF e o governo retorna algo dos impostos). Veio a nota e eu perguntei: é nota paulista? Ela olhou e falou: ah, não saiu o CPF (óbvio, já que ela não tinha perguntado qual era para adicionar). Normalmente resmungaria e deixaria passar, mas lembrei da minha resolução e falei: pois eu quero a nota paulista. Veio a gerente, desfez a compra e registrou tudo novamente. Eu virei para trás e pedi desculpas para a fila quilométrica, cônscia da minha nova posição no mundo: "eles cobram caro demais aqui para a gente não exigir os direitos que temos". Refeita a compra, fui sentar. Escolhi uma mesa que estava cheia de pratos e comecei a tirá-los e colocar no balcão. A gerente falou: " a sra. não quer sentar naquela outra alí?" que estava limpa. Falei que não, meio sem pensar. No mesmo minuto, veio correndo uma garçonete com um pano, tirou tudo e limpou minha mesa, assustada. Sentei-me e percebi que cumprira minha resolução a risca até aquele momento. O resultado? Em menos de uma manhã já tinha conseguido me transformar numa chata de galocha.

A química, a física e a metafísica

Na real não se precisa muito para refletir sobre a vida. Lavando roupa, por exemplo. Das tarefas domésticas, essa é uma que eu gosto. Lidar com água. E com a química. Claro, lavar roupa é uma tarefa que envolve a química e a física. No meu caso, mais a química. Pq eu me recuso a enfrentar o ato físico de esfregar, torcer, etc. Tudo isso fica a cargo da boa e velha máquina de lavar. Um dos poucos instrumentos tecnológicos da racionalidade capitalista que me faz agradecer pela sociedade mecanizada. Mas, voltando ao ponto: ao me recusar a enfrentar a física em toda sua plenitude, acabo refém da sua irmã gêmea, a química. Agarro-me a uma fé irrestrita na capacidade de ação molecular. Uma crença inabalável em todos os produtos que prometem branco total, que dissolvem a sujeira mais enraizada. Que limpam sem manchar. Que deixam a roupa brilhante. Que tiram o encardido das meias brancas, sem atacar os tecidos, veja bem!. Ou seja, nessa prosaica operação cotidiana passo por séculos de trnasformação do pensamento científico. E, como acontece com boa parte daqueles que se põem a refletir sobre o mundo, desemboco na metafísica. E, confesso, muitas vezes descambo para a fé pura: aquela que faz rezar para que a roupa fique limpa e não estrague com tanta coisa que adiciono ao molho.

quinta-feira, 2 de junho de 2011

Escolhas

Ontem falava com uma amiga no telefone. Eu correndo entre uma aula e outra, querendo que ela fizesse um sacrifício para resolver um problema que outros arranjaram para mim. Odiável, mas necessário. Ela, funcionando desde cedo, tendo dormido tarde e mal chegando em casa. Nós, aos gritos e sussuros nos celulares. De repente, ela me diz que está em casa, segurando um ovo. E me pergunta se eu não fico às vezes incomodada com as escolhas que fazemos. O inusitado da situação, o desconforto do que tentávamos resolver, a correria ou o ovo que ela segurava porque não teve tempo de fazer algo com ele, fez-me pensar. Ela tem razão. Que raios de escolha é essa que fizemos? Dormir tarde, acordar cedo, atender centenas de alunos toda a semana, dar aulas, produzir papers, ir a congressos, participar de uma infinidade de entidades, associações, grupos de pesquisa. Sem tempo para absolutamente nada, a não ser para as outras infinidades de coisas que temos que fazer e aparecem de repente. Ah, mas professor tem dois meses de férias... Qual. Sabe o que professor faz nas férias? Produz trabalhos. Do mesmo jeito que corrige provas nos feriados. Ela simplesmente tem razão. Há algo muito errado ou na escolha, ou na forma como levamos a vida. Ou nas duas coisas. Talvez seja o capitalismo monopolista neoliberal tardio. Ou qualquer coisa assim. O fato é que o social entranha no individual e nossas escolhas parecem, a cada dia que passa, mais pesadas e incompreensíveis.

terça-feira, 24 de maio de 2011

Insônia

Vagando pela casa. Com frio. Tá bom, alivio bebendo tequila. Torcendo para ter sono, mas qual. Sem conseguir fazer nada de produtivo. Poderia mexer no texto que tenho que arrumar urgentemente para o Má traduzir. Ou corrigir as mil provas que me esperam com a boca aberta, cheias de dentes pontiagudos. Quem dera. Estou lendo um texto, mas completamente desatenta. É irônico, porque ele é sobre o rádio e fala na escuta desatenta. Bingo. Escuta e leitura. Tenho um livro legal de mistério (a-do-ro). Muito bom mesmo, da Fred Vargas. Se pegar, não largo até amanhã (não sou daquelas que dormem com livros. Nem com TV). E quem vai segurar o amanhã, depois? Texto para corrigir e terminar, provas para corrigir e entregar. Além das outras três ou quatro tarefas do trabalho. E quarta é dia de faxina. Tenho espinafre e agrião que o Má trouxe do sítio para limpar. Tarefas para organizar. Pelo menos ele aprendeu a por o agrião no vaso com água para conservar. Um dia, quem sabe, aprende a limpar e colocar na geladeira. Ou seja, o amanhã (hoje) promete. Nessas horas, lembro com sou parecida com meu pai. Ele trocava a noite pelo dia, nunca trabalhava de manhã. Começava a funcionar à tarde, acordava perto das onze horas. E ia madrugada adentro. Dizia que era o único horário em que a casa ficava quieta e ele conseguia escrever. Pensando bem, até o cachorro dorme. Os únicos barulhos são do teclado e o do relógio atrasado que tenho na cozinha-- com tantos lugares, escrevo na cozinha. Só que eu, por uma conjunção de fatores, trabalho de noite e de manhã. Que acontece ser de madrugada. Meu fuso horário não combina com meu fuso interno. Porque, ao contrário do meu pai, escolhi a convivência com os funcionários, sendo sempre a bailarina. Como diria Caetano, cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é. O problema reside em que a gente não sabe exatamente o que é. São quase três da matina e eu tenho realmente que dormir. Mas, para finalizar, lembro novamente no meu pai (ok, sou edipiana assumida), que tinha a pachorra de dizer que "um homem relaxado poderia ser um filósofo, mas uma mulher relaxada seria sempre apenas uma mulher relaxada", mas que, ao contrário do restante da humanidade, toda vez que eu me queixava sobre minha existência, dizia: "minha filha, é claro que vc tem o direito de sentir-se assim. Eu no seu lugar, me sentiria muito pior". Às vezes a possibilidade de um telefonema faz muita falta.

Digníssima Profa. Dra. Emérita

Minha mãe foi agraciada com o título de Professora Emérita da Universidade Federal de Santa Catarina. Tudo na maior estica. Com o Digníssimo Professor Doutor Reitor de beca. E todos os outros. Pode parecer que não, mas foi uma cerimônia muito legal. Porque apesar da formalidade da ocasião, a informalidade conseguiu penetrar todos os momentos. Desde a homeangeada que quase caiu da cadeira, os seus ex-alunos (atualmente colegas professores) que entregaram flores e presentes fazendo gestos burlescos, os discursos curtos (sempre os melhores) e emocionantes. O da minha mãe estava bem legal, falando do passado e, principalmente, do presente e do futuro. O que é considerável, se pensarmos que ela está aposentada e absolutamente decidida a continuar trabalhando exatamente como antes - sem tirar nem por. Ou melhor, pondo, que cada dia ela parece arranjar mais coisas para fazer. O mais pitoresco talvez tenham sido as interferências indevidas da minha avó. Que fez a maior manha para ir, imaginem. Estava com medo de atrapalhar a cerimônia tossindo. Bem, ela não tossiu. Mas falou alto em diversas ocasiões impróprias, durantes os discursos, por exemplo - como não escuta bem tem esta tendência. A melhor foi quando o digníssimo reitor estava encerrando a solenidade e a Valéria, sua acompanhante e anjo da guarda, resolveu tirar fotos quase colada no homem. A vó não teve dúvidas, tascou um "como a Valéria é metida" lá do seu canto na primeira fila. Que foi ouvido pelo auditório e fez todo o Conselho Universitário, postado embecado atrás dela, rir e correr o risco de perder a pose. Foi muito bom. Sentimento estranho esse, da gente se orgulhar dos pais, no caso da mãe, com o orgulho que temos dos filhos. E, como fazemos com os filhos, ficar exibindo a mãe para os outros.

segunda-feira, 18 de abril de 2011

Irmãs

Querida amiga
Hoje recebi por e-mail uma daquelas apresentações em slides sobre sentimentos, etc. Geralmente elas são bem piegas e esta não escapou. Mas quem mandou foi a Taty, minha amiga mais antiga. Nos conhecemos quando tínhamos três anos e por isso eu só lembro da roda do carro e das pernas do pai dela. E daquela menininha com cabelinho de milho e botinhas brancas. Minha primeira amiga, acho que a primeira pessoa da minha idade com quem travei contato. Então, fiquei muito emocionada dela ter me colocado no rol das suas irmãs -- pois era sobre a amizade feminina a apresentação. E resolvi repassá-la. Foi aí que me dei conta que não poderia repassar para você, que já se foi. E que faz um ano da tua partida. É claro que eu sabia disso. Como explicar minha tristeza maior do que o rotineiro nesse mês? Como entender que a Páscoa para mim deixou de parecer recomeço e virou término? Faz um ano e eu sinto muito tua falta. A leveza para tratar os problemas alheios, mesmo que te faltasse quando era para tratar dos teus. E teu jeito non sense de se colocar na vida. Lembra como nos conhecemos? Eu estava almoçando no Centro de Convivência da UFSC e você se apresentou dizendo que era a Vanessa, que estagiava na Colônia Santana e que tinha um louquinho (não eramos politicamente corretos nessa época) que adorava nós duas: você pelas pernas e eu pela inteligência. Bastou isso e ficamos amigas para sempre. Hoje, pensando bem, acho que o louquinho não foi muito justo, nem com a tua inteligência, nem com as minhas pernas. E depois disso, tantas coisas divididas e compartilhadas. Pois é. Mandei a apresentação para várias amigas, irmãs. Mas faltou você, querida.

sexta-feira, 15 de abril de 2011

O objeto

Existe por aí um objeto de estudo me rondando. Eu, que não acreditava na imanência do objeto, sou obrigada a repensar a premissa. Ele está me sondando faz já um tempo. Em um tipo de aproximação cautelosa, geralmente se apresenta meio disforme, quase uma névoa. Mas às vezes, mesmo que rapidamente, aparece em quase sua complexidade. Daí consigo entrever rasgos sobre o leitor e seu suposto contrato com o texto. Um pouquinho aqui e ali da relação jornalismo e verdade, quase como pano de fundo, porque na frente estão os dispositivos de leitura, apreensão. Outras vezes, esses elementos são a primeira camada, coberta por perguntas sobre a documentação audiovisual, a indexação do documentário, o fator indicial. Nessas horas meu objeto provoca-me um calafrio: será que ele pretende que eu adentre o universo semiótico? Até que ponto? Apesar de não ser um sentimento muito nobre, nesses momentos tenho ganas de fugir dele. Mas, estou aprendendo isso, os objetos não só existem como exercem um estranho fascínio sobre nós. Por mais que desejemos, não conseguimos nos livrar deles. Então, mesmo sem querer, vejo-me na biblioteca buscando livros e mais livros. Na esperança de que eles possam me ajudar a resolver esse mistério, iluminar meu objeto a ponto de torná-lo nítido. Mas não iluminam, ao contrário. Sinto meu objeto olhando-me ao longe, cada vez maior e menos razoável. E quando estou prestes a me desesperar, de alguma forma ele me consola. Sussurra em meu ouvido que eu não devo me preocupar, que nosso encontro acontecerá, inevitavelmente. Mas não será imediato, fácil. Prazeroso, com certeza, mas também difícil, trabalhoso. E que nosso conhecimento mútuo será um processo. Ele me escolheu, é verdade. Mas ambos precisamos de tempo para termos algum nível de certeza.

quinta-feira, 14 de abril de 2011

Expressões

Existem expressões ótimas vagando por Cunha. Que só descobrimos quando nossas andanças nos levam para os rincões da roça. Como a máxima "quem anda pela cabeça dos outros é piolho", muito bem aplicada para dar conta daquele indivíduo que aceitou sugestão alheia e não se deu propriamente bem. Que foi o caso do motorista da máquina que rodou, mas isso é outra estória que conto dia desses. Uma das que eu mais gosto é a "mesquinha de orelha" (pronuncia-se misquinha de oreia). Refere-se ao cavalo ou égua que tem a mania de mexer a cabeça para impedir de colocar o cabresto. Acho esta ótima e fico pensando em como aplicá-la no contexto urbano. No meu contexto urbano, propriamente. Para começar é bom ficar claro que não deixar colocar o cabresto não é algo bom, sinal de saudavel rebeldia. Ao contrário, é uma balda (teimosia, mau costume - pronuncia-se barda) e como tal desvaloriza o animal. Tem uma situação que me parece adequada para o uso da expressão: naquelas intermináveis reuniões para discutir o futuro do campo da comunicação, quando um professor(a) doutor(a) toma (literalmente) a palavra e impõe seu ponto de vista. E, quando qualquer outra criatura aventura-se a contestar vê seu direito à palavra grosseiramente cortado. Fico pensando que nessas horas bom seria alguém levantar e dizer: "prezado(a) professor(a) doutor(a), por favor não seja misquinho(a) de oreia, respeite o direito do outro, pô!" Mal não faria. P.S. : é claro que eu tenho um misquinho(a) de oreia em mente. Que espero não leia esse blog. Mas caso leia e sinta-se ofendido(a) só posso retrucar com outra expressão, nacionalmente conhecida: se a carapuça serviu...

segunda-feira, 4 de abril de 2011

Universo Feminino

Leio Lucia Guimarães no Estadão. Fala sobre Hillary Clinton, Dilma e outras mulheres. Sobre o poder e a mulher, decisões de estado, formas de fazer política e de não fazer. E eu só consigo pensar quando, ou se, vou arranjar tempo para ir ao cabeleireiro.

quinta-feira, 17 de março de 2011

Outros telefonemas

Conversando com minha amiga Claudia Dalla, que é roteirista (e não tem um blog, uma pena!), descobri estórias saborosas sobre telefonemas que aconteceram com ela, da época que telefone não tinha bina. A primeira: Claudia acorda com o telefone tocando. Atende meio zonza. sleshslesslhe. Ela não entende: hã? sleshslhesslheee. Continua sem entender: hãa? shelshseslheslhs. Ah, ela agora entende: são obscenidades matinais. Ela fala: eu não estou escutando. shehslehsshels. Não consigo ouvir nada, vc pode repetir? seslheslhslahlshal. Tá horrível, dá para falar mais alto? slahelhsalsla (em alto e bom som). Esse telefone é uma droga, quem tá falando? slahlhlshlshslhso. Não tá dando para ouvir nada. SLHESLHESHEK . Não consigo ouvir nada mesmo, GRITA, POR FAVOR. Silêncio. O outro lado desliga. Em nova ocasião: Uma voz de mulher muito brava liga e pergunta: você é a Claudia? Sou. A voz continua: eu vou te dar só um aviso, para de andar com meu marido que você não sabe do que eu sou capaz. A Claudia tenta falar e a voz desliga. Conclusão da Dalla: o marido dela deve estar até hoje com uma outra Claudia...

segunda-feira, 14 de março de 2011

O chato do telefone

Tem um cara que há anos liga lá para casa na esperança de ganhar alguém. Isso começou há um tempão e desde então nunca parou. Ele liga e engata uns papos estranhos, geralmente no final de semana. E deixa milhões de recados semi obscenos na secretária eletrônica. Ele liga a cobrar e provavelmente não escuta que é um atendimento automático. Aí, fica provocando: "não quer falar, querida? fala alguma coisa... sua gostosa". Ou ele é meio lesado ou tem tara pela secretária eletrônica. É hilário, mas também bem chato. Chego em casa e tem lá umas vinte ligações do pente, que eu pago, além de tudo. Isso há anos. Já pegamos o telefone dele na bina. O Má já ligou e ameaçou com polícia, deu uma bronca geral. Parou por uns tempos. Depois ele troca o celular(sempre de fora de São Paulo) e começa tudo de novo. É tão persistente que todos nós, acho que até o cachorro, já conhecemos a voz do sujeito. Facílimo de identificar, o meliante meloso. Pois bem. No sábado estava eu serelepe em casa, final de tarde, tomando um café na varanda. Toca o telefone. A cobrar. Número não identificado. Eu suspiro. Alô? "É da casa da Marcia?" Não, não tem Marcia aqui (já sei que é ele). "É da onde, querida?" (O idiota tenta). Eu perco a paciência e grito: "não acredito, é aquele homem pentelho de pinto pequeno que insiste em ficar ligando". Enquanto eu dou o ataque escuto ele falar aturdido do outro lado : "não, não". Desligo. E, pela primeira vez, ele não liga novamente.

domingo, 13 de março de 2011

Está decidido

Não vou trabalhar mais do que 40 horas por semana. Vá lá, talvez 44. Mas nunca mais que isso. Nunquinha. Tudo o que faço deverá caber nesse espaço-tempo. Sem choro nem vela. Nem fita amarela, nem nada. Nadinha. Ou melhor, tudinho dentro deste tempo, milimetricamente cronometrado. Dar aulas, preparar aulas, corrigir trabalhos, organizar a pesquisa na Escola de Comunicação, estudar. Participar de reuniões, ajudar a organizar congressos, dar pareceres em abstracts, papers, orientar iniciação científica, revisar e atualizar o livro, participar dos grupos de pesquisa, organizar material para publicar, preparar textos para apresentar em congressos internacionais e nacionais. Em 44 horas semanais. O que fica de fora? Os deslocamentos para o trabalho, a organização da casa e o acompanhamento da faxina. Lavar a roupa e, de vez em quando a louça, também não conta. É trabalho, mas trabalho doméstico nunca entrou no computo, certo? Por que entraria agora? Cuidar do gato e do cachorro, cozinhar vez por outra também não entram na matemática. E costurar, ler romances de mistério, ver TV definitivamente são lazer, então nada de colocar nas 44 horas. Caminhar e fazer exercício não é lazer, e ter aula de inglês também não. Mas não deve ser trabalho, tão pouco. Aliás, o que é o trabalho, realmente? Aquilo que é remunerado? Então boa parte das minhas atividades não entram no pacote, mesmo que estejam ligadas à vida acadêmica. Pensando bem, talvez o melhor mesmo seja mudar de profissão. Arranjar uma dessas bem confortáveis, em que a gente trabalha das 8 às 18 com duas horas de almoço e ponto. Isso existe?

sábado, 12 de março de 2011

Wendell, I´m not content


Este é um cartum de Gary Larson. Há algum tempo identifico-me com a personagem. Não as pérolas, nem o martini. Mas a janela e a sensação de que algo acontece lá fora e de que eu estou trancada aqui dentro, insatisfeita. No meu caso não com o Wendell, mas com a vida em geral. Insatisfeita é o termo preciso. Não profundamente infeliz, nem irremediavelmente contrariada. Insatisfeita, tão somente. Não pelo que acontece no dia a dia. Mas pelo que poderia acontecer. Nessas horas oscilo entre a virtude cristã da aceitação da vida como ela é e não como eu gostaria, e o paganismo romântico que estimula a idealizar. Não é tarefa fácil (nunca é). Apesar da idéia de largar o velho e começar o novo que supostamente dará mais prazer (ou dará algum prazer, em muitos casos) ser extremamente sedutora, a ação em si é muito mais do que isso. Porque largar implica em perder também. Em muitos casos, em contrariar todo um sistema de vida e de afetos. Implica em abandonar compromissos assumidos com os outros e, pior, com a gente mesmo. E aí entra a culpa/responsabilidade cristã. Por que fazer tudo diferente é menos difícil quando se é adolescente e não se tem uma família para sustentar, por exemplo. Ademais, mudar de vida requer muita coragem. Por isso não mudamos radicalmente, vamos aparando as arestas. Mesmo quando a vontade é se tornar algo completamente diferente.

quarta-feira, 9 de março de 2011

Nature or nurture

Esta é uma grande questão, desde que os homens resolveram separar as duas partes. Geralmente eu fico no meio termo. Tanto nature quanto nurture. Mas hoje, atribuo à natureza, precisamente ao DNA, boa parte dos meus problemas. Concluí, com alguma ajuda, que eu tenho o gen Go Fun recessivo. O dominante é o No Fun. Por isso, face às inúmeras possibilidades da vida, eu sempre escolho aquela que dá mais trabalho e menos prazer. Escolho compromisso e, porque não, commitment. Sempre. Podia estar viajando, prolongando o carnaval merecido. Mas o que faço? Preparo-me para acordar às 5 horas e ir para uma aula que não terá alunos. Eles com o Go Fun dominante, como deve ser. É ou não burrice? Não, não é burrice. É inevitabilidade genética. E se fosse só um feriado mal curtido, tudo bem. Mas é uma constante. Numa encruzilhada, pode apostar. Vou sempre escolher o caminho mais tortuoso, mais trabalhoso, aquele que não leva a lugar algum. Só a uma solitária consciência de que fiz "o melhor". Pensando bem, talvez seja uma combinação de nature e nurture. O gen dominante No Fun com uma educação calvinista em que Deus foi substituído por um genérico senso de dever. Pelo compromisso com a biografia.

sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

Prepare-se

Você vai ter inimigos. Foi a frase que ouvi quando aceitei uma posição qualquer que daria uma certa projeção. Uma certa, bem pequenina. Isso, mais minha exuberante disposição em meter-me em encrenca, fazer coisas alucinadamente o tempo todo e ter um DNA de alpha dog, com certeza criam um quadro propício para os tais "inimigos". Não que as pessoas sejam más ou horrorosas. Mas são, na maioria das vezes, inseguras, ciosas sobremaneira de seus parcos espaços. E sempre dispostas a se defender de supostas ameaças, criadas por suas próprias inseguranças. Eu não sou muito insegura, pelo menos no plano profissional. Acho que concentro minhas quimeras junto àqueles com quem tenho relações afetivas íntimas (marido, filh@s, amigas absolutamente chegadas). E esta falta de insegurança, aliada às características supra citadas, garante-me vários dissabores nos (des)encontros com o povo do freio puxado -- claro que isso é uma coisa relativa, já que minha comparação é comigo, o carro sem freios ladeira abaixo. Só que, apesar destas características, eu tenho outra bastante desvantajosa nestas situações: um profundo apego ao ser humano. E não gosto da perspectiva de me ver rodeada de gente que não gosta de mim, ou que tem receio. Resumindo: eu me importo. Não quero inimigos.

domingo, 2 de janeiro de 2011

A foto e os mortos

Minha avó, com seus 93 anos, gosta de mostrar algumas fotos para quem vai visitá-la. Uma, em especial, chama a atenção. São cerca de 15 homens enfileirados mostrando felizes o produto de uma caçada. Porque é claro que meu avô e seus primos, gaúchos gaudérios, caçavam. Vira e mexe a vó mostra a foto com o mesmo comentário lacônico: "de todos estes que estão aqui só o Bibe e o Renan estão vivos..." Mostra e comenta, invariavelmente. Dia desses minha prima foi visitá-la com sua filha, a Paulinha, que tem seis anos. A Paulinha viu a foto e escutou a conversa. Depois, quando apareceu outra visita, a Paulinha ouviu repetir-se a estória. Na terceira vez, não se aguentou. Olhou bem séria para minha vó e perguntou: "será que foi o flash que era muito forte?".